Buscas à sede do PSD: O erro dos políticos
Temos assistido a um coro de críticas ao Ministério Público por causa das buscas realizadas à sede do PSD e à residência do ex-líder do partido.
O Ministério Público não pode ser imune às críticas e qualquer cidadão tem o direito à indignação quando entender que os seus direitos foram cerceados, tanto mais que o poder e os instrumentos que o Ministério Público tem ao seu dispor são esmagadores quando comparado com as barreiras defensivas do cidadão.
Em regra, numa investigação criminal, existem várias fases até as autoridades competentes autorizarem uma busca. Em primeiro lugar, a notícia de um crime impulsiona o órgão de polícia criminal a realizar um conjunto de diligências que lhe permite ou não confirmar a existência de indícios da prática de crime. Em segundo lugar, com base nesses fundados indícios, o órgão de polícia criminal solicita ao Ministério Público que autorize ou promova buscas, consoante sejam da sua competência ou de um juiz.
Na fase da investigação é apenas o Juiz das liberdades que funciona como contrapoder do Ministério Público uma vez que o suspeito ainda não tem intervenção processual no processo. Ou seja, aos ataques de intrusão, nos direitos fundamentais dos cidadãos, através dos meios de prova requeridos pelo Ministério Público – escutas telefónicas, buscas, videovigilâncias – apenas têm o freio do Juiz das liberdades.
A busca realizada à residência do ex-líder do PSD, foi – só poderia ter sido – o juiz a autorizá-la. Nos termos da lei é o juiz – e só o juiz – que pondera se estão reunidos os requisitos para autorizar a busca. Os princípios da necessidade, da proporcionalidade e da subsidiariedade apenas podem ser devidamente ponderados à luz de um conjunto de elementos constantes do processo. Isto significa que o Juiz é o último reduto para decidir se a prova requerida pelo Ministério Público – busca – respeita os princípios da necessidade e da proporcionalidade e, ainda, se a investigação poderia prosseguir os seus fins através de um outro meio de prova menos intrusivo, respeitando assim o princípio da subsidiariedade.
Na praxis forense encontramos várias decisões de juízes a indeferirem diligências de prova ao Ministério Público. Infelizmente, também são frequentes as decisões do Juiz a arrimarem-se nas doutas promoções do Ministério Público o que, diga-se, são o fundamento para as defesas anularem vários processos.
É, pois, muito claro que a decisão de autorização da busca à residência do ex-líder do PSD pertenceu exclusivamente ao Juiz e, neste sentido, são totalmente incompreensíveis as críticas dirigidas ao Ministério Público.
Ao que se sabe, o Ministério Público autorizou uma busca à sede do PSD, sendo esta, da sua inteira responsabilidade. Neste caso suscita-se, desde logo, a questão de se saber se a competência para autorizar essa busca não seria do Juiz. É que a sede de um partido político deposita um conjunto de elementos de tal relevância que apenas um juiz a eles pode aceder. Não se pode equiparar uma busca à sede de um partido político com a busca a um armazém ou até a um escritório de uma empresa. O bem jurídico protegido numa sede de um partido político – com o acréscimo de se tratar do maior partido da oposição, de um partido que tem alternado a governação com o partido do governo – pode prender-se com interesses relevantes para o Estado Português.
Mesmo que a busca pudesse ter sido autorizada pelo Ministério Público a ponderação de interesses em jogo impunha um cuidado redobrado na verificação dos pressupostos, existindo, aparentemente, motivos para se defender a invalidade desta diligência pela violação de qualquer um dos princípios acima apontados.
Regista-se a enorme ousadia do Ministério Público em arriscar a autorização de uma busca a um domínio tão sensível, de um ponto de vista probatório – certamente com a apreensão de vários dispositivos informáticos, como telemóveis e computadores – cuja intervenção do Juiz é imposta por lei.
Aqui chegados, os visados por estas buscas apenas tinham um caminho a trilhar.
Quanto à busca autorizada pelo Juiz, deitarem mão dos meios processuais adequados e interpondo, se necessário, o competente recurso para o Tribunal superior, invocando a violação dos princípios da necessidade, da proporcionalidade e da subsidiariedade, pugnando pela invalidade da prova.
Quanto à busca autorizada pelo Ministério Público, a solução seria suscitar a sua nulidade junto do Tribunal, com fundamento na sua incompetência e, ainda, invocando a violação dos princípios acima mencionados. Caso o Juiz não atendesse ao pedido, apresentariam recurso para o Tribunal superior.
Deste modo, teriam razão quanto à forma – porquanto teriam exercido os seus direitos nos termos da Lei – e na substância – caso os tribunais lhes viessem a dar razão
Seguindo esta via, os nossos políticos respeitariam a separação de poderes e seriam o exemplo de que os seus direitos podem ser exercidos dentro do sistema de justiça e não na praça pública, descredibilizando as instituições e a própria justiça portuguesa.
Artigo por: Carlos Melo Alves