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11 Fevereiro 2021
O direito olha para o Mundo? O início de uma investigação

Este artigo resulta da discussão travada no dia de ontem, na qual se problematizou a legalidade de iniciar uma investigação criminal quando o conhecimento da prática de um crime advém da prova proibida.

Sabemos que este entendimento não é consensual – longe disso, mas nem por isso deixaremos de nos atrever a avançar com uma interpretação possível do quadro processual-penal vigente.

A tensão permanente entre a defesa dos direitos fundamentais e o dever do Estado na prossecução dos criminosos conduz-nos a procurar determinar as implicações sobre o efeito-à-distância das proibições de valoração de prova numa perspetiva da sua relevância prático-jurídica.

Os órgãos de Polícia Criminal que recebem a notícia de um crime têm o dever de desencadear determinados procedimentos que podem conduzir à instauração de um inquérito por banda do Ministério Público. A problemática cria-se quando a notícia do crime tem origem em meios de obtenção de prova proibidos.

É no momento do conhecimento da existência de um crime que se aplicaria o regime atinente à contaminação da prova. Nesse caso, o Direito Penal cumpriria a sua função na proteção das vítimas e na defesa dos direitos fundamentais do cidadão?

Socorramo-nos de um exemplo em que, através do acesso ilegítimo aos dados de um sistema informático, propriedade de um cidadão, se colheram fotografias que provam que esse indivíduo provocou a morte de um outro. Nessa sequência, as fotografias são divulgadas e toda a comunidade entende ter ocorrido um crime de homicídio. À primeira vista, parece-nos que, à luz dos princípios, nada impede que seja iniciada uma investigação e instaurado um inquérito, pelo menos, contra desconhecidos.

A questão controversa é se o regime do efeito-à-distância se aplica numa fase chamada de ’pré-inquérito’, na qual o órgão de Polícia Criminal desenvolveu um conjunto de diligências, dentro dos limites da Lei, no sentido de apurar se estamos na presença de um crime.

Dificilmente se compreenderia que, nesta fase, os polícias estivessem vinculados aos raciocínios jurídicos, no caso, à aplicação dos princípios decorrentes do disposto no artigo 122.º do CPP.

De outro modo, os obstáculos à abertura de um inquérito adivinhar-se-iam, muitas das vezes, intransponíveis quando os polícias se confrontassem com conhecimentos indiretos e/ou anónimos, como convicções pessoais de testemunhas ou vozes públicas, ainda que credíveis (podem ser!).

Vale dizer que é no âmbito do inquérito-crime que o efeito-à-distancia ganha toda a sua projeção ao nível da doutrina da imputação objetiva, ditando o fim da proteção da norma, processos hipotéticos de investigação e comportamentos lícitos alternativos.

É nesta fase processual que o detentor da ação penal tem de ponderar de que meios de prova a investigação se pode socorrer, por forma a não cair na armadilha da contaminação de prova. O jogo probatório começa verdadeiramente neste momento processual.

Já se vê que nenhum meio de prova intrusivo – vide escutas telefónicas e/ou buscas – pode ser autorizado pelo Tribunal com fundamento nos elementos decorrentes do referido sistema informático, nem tão pouco em provas dele derivadas.

Deste modo, em meu entender, o Estado não está tolhido de prosseguir os criminosos, conquanto guarde respeito pelos direitos fundamentais do cidadão.

Artigo por: Carlos Melo Alves

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